Hoje, os mercados americanos retomam sua liquidez usual após o feriado que fechou o mercado de títulos ontem, o que já traz pressão sobre os yields nesta manhã. O mercado agora começa a incorporar as primeiras sinalizações da transição de governo e as indicações de nomes para compor o gabinete de Trump. Por exemplo, a possível nomeação do senador Marco Rubio como secretário de Estado gerou preocupações nos mercados asiáticos, refletindo expectativas de uma postura externa mais agressiva, ainda que Rubio possa ser interpretado como uma ala mais tradicional republicana (ele mesmo concorreu contra Trump em 2016 nas primárias do partido).
Nos mercados globais, os ativos de risco seguem firmes nas tendências otimistas associadas ao que ficou conhecido como "Trump Trades". O S&P 500 continua registrando novos recordes históricos, enquanto o mercado de criptomoedas, com o Bitcoin próximo da marca dos US$ 90 mil, também chama bastante atenção. Esse movimento impulsiona os juros para cima e fortalece o dólar, criando desafios para outras economias, especialmente as emergentes, que são mais sensíveis.
Na Europa, os índices operam em baixa nesta manhã, em linha com os futuros americanos, influenciados por dados recentes de atividade econômica no velho continente. A agenda do dia traz, ainda, a temporada de resultados corporativos e discursos de autoridades do Federal Reserve, que poderão reforçar a percepção de uma trajetória de juros elevados nos EUA, mesmo com a expectativa de mais alguns cortes no ciclo atual de flexibilização. Já a COP29, a cúpula climática realizada no Azerbaijão, segue com pouco destaque. No Brasil, o foco continua sendo a política fiscal, que permanece no centro das atenções e das expectativas do mercado.
Só depois do G20? Péssima notícia se for verdade…
No cenário econômico doméstico, além do acompanhamento da temporada de resultados e da análise minuciosa da ata do Copom — que ressaltou a preocupação do Banco Central com a situação fiscal — o foco dos investidores continua voltado para a finalização e o anúncio do aguardado pacote de cortes de gastos. Em declarações recentes, o ministro Haddad afirmou que o pacote de austeridade está quase concluído, com acordos já firmados nas áreas de Saúde, Educação, Desenvolvimento Social e Trabalho. Sabe-se que o presidente Lula sugeriu a inclusão de um ministério adicional, possivelmente o da Defesa, para ampliar o impacto das medidas fiscais, embora os detalhes completos ainda não tenham sido divulgados. A data do anúncio oficial será decidida pelo presidente, com a possibilidade de que o comunicado só ocorra após a cúpula do G20, marcada para os dias 18 e 19 da próxima semana, mas uma antecipação do anúncio poderia trazer alívio às expectativas de mercado.
Hoje, Haddad se reunirá com Arthur Lira e Rodrigo Pacheco para discutir alternativas que acelerem a tramitação das propostas. No entanto, a contínua demora e a persistente incerteza seguem pressionando as expectativas de inflação, que continuam desancoradas (o Boletim Focus refleteiu essa piora com ajustes para cima nas projeções de inflação: as estimativas para 2024 subiram de 4,59% para 4,62% e, para 2025, de 4,03% para 4,10%). Não ajuda em nada o PT assinar manifesto contra corte de gastos — com uma base partidária de apoio dessas, quem precisa de oposição?
Como consequência, tanto a curva de juros quanto o dólar no mercado local têm mostrado tendência de alta no início da semana, acompanhando o fortalecimento do dólar global, em reação à eleição de Donald Trump nos Estados Unidos. Há também incertezas quanto ao impacto de uma postura comercial mais protecionista de Trump, especialmente contra a China, no Brasil. Embora tais políticas possam criar desafios, elas também podem gerar oportunidades para o agronegócio brasileiro, caso represálias chinesas facilitem novos acordos comerciais para o Brasil.
O que está na mesa?
A importância do novo pacote fiscal não se concentra tanto no impacto imediato, projetado entre R$ 30 e R$ 50 bilhões, mas sim na profundidade e eficácia das medidas que serão implementadas. O mercado valoriza mais uma estratégia fiscal que, mesmo tendo efeitos moderados no curto prazo, promova reformas estruturais capazes de conter o crescimento da dívida pública a longo prazo, em vez de um pacote maior focado em cortes pontuais com impacto fiscal incerto e temporário.
Entre as principais propostas em discussão estão a adoção de um teto de crescimento real anual de 2,5% para algumas despesas obrigatórias, incluindo os pisos para saúde e educação e as emendas parlamentares. Outras medidas analisadas incluem a flexibilização dos repasses para determinados fundos, ajustes no seguro-desemprego, no Benefício de Prestação Continuada (BPC) e no abono salarial, e a restrição do reajuste do salário mínimo, limitando-o ao teto de crescimento permitido pelo arcabouço fiscal. Avalia-se também a desvinculação de certos benefícios sociais, com o objetivo de dar mais sustentabilidade às contas públicas.
Não se espera que o pacote neutralize totalmente os efeitos de um dólar mais valorizado, da alta de juros nos Estados Unidos ou de possíveis restrições comerciais impostas por Trump à China. No entanto, um plano fiscal consistente pode melhorar substancialmente o ambiente de negócios no Brasil para a reta final do ano.
Trump Trade continua deixando o mercado eufórico
Nos EUA, o mercado acionário manteve sua trajetória de alta, com o S&P 500 avançando 0,1% e encerrando o dia acima dos 6 mil pontos pela primeira vez. O Dow Jones Industrial Average também apresentou ganhos significativos, subindo 0,7% e registrando seu primeiro fechamento acima dos 44 mil pontos.
O índice Russell 2000, por sua vez, destacou-se ao saltar 1,5%, ampliando seu rali pós-eleitoral para 8% em apenas quatro dias. Esse movimento reflete o forte impulso das small-caps, principais beneficiárias do chamado "Trump Trade," uma vez que essas empresas de foco doméstico tendem a se favorecer de políticas comerciais mais protecionistas. Adicionalmente, um ambiente regulatório mais flexível pode incentivar fusões e aquisições, impulsionando ainda mais essas empresas menores.
A agenda de hoje segue com a temporada de divulgação de resultados corporativos, com destaque para empresas como Home Depot, Shopify, Spotify, Occidental Petroleum, Tyson Foods, Tencent Music Entertainment Group, Hertz e SoftBank. Na esfera econômica, teremos a divulgação da pesquisa do Federal Reserve de Nova York sobre expectativas de inflação, embora com uma relevância relativamente secundária frente aos demais eventos.
Reshoring
As empresas americanas, especialmente aquelas que dependem significativamente de cadeias de suprimentos no exterior, já se preparam para enfrentar mudanças substanciais. Espera-se que o presidente eleito, Donald Trump, cumpra sua promessa de campanha de implementar tarifas que podem variar de 60% a 100% sobre produtos importados da China e de 10% a 20% sobre outras importações. Algumas empresas já desenvolveram planos de contingência, enquanto outras agora correm para ajustar seus modelos de negócios a essa nova realidade. Diversas companhias vêm investindo em fábricas em países como Camboja, Vietnã, México e Brasil, numa estratégia para diversificar ou aproximar a produção dos Estados Unidos, com o intuito de proteger suas cadeias de suprimentos e reduzir a exposição a riscos e incertezas da próxima administração. Esse movimento incentivará também um retorno de fábricas aos EUA, impulsionado pela expectativa de cortes de impostos e flexibilização regulatória.
Todo mundo está se preparando
O cenário global está se ajustando para uma nova dinâmica de comércio internacional, impulsionada pelas propostas comerciais robustas de Trump. Suas políticas são consideradas tão agressivas que muitos temem, na melhor das hipóteses, uma intensificação das tensões internacionais e, na pior, uma guerra comercial em larga escala. De acordo com estimativas do Goldman Sachs, o crescimento do PIB dos países da zona do euro deve cair para 0,8% no próximo ano, abaixo da previsão anterior. A Alemanha, em especial, pode enfrentar um impacto severo, pois seu principal produto de exportação são os automóveis, e os EUA são seu maior mercado consumidor — um cenário que ameaça diretamente empresas como a Volkswagen.
Em outras palavras, com a perspectiva de que Trump possa estender sua guerra comercial da China para a União Europeia, as economias europeias, particularmente a alemã, podem ser duramente atingidas. Enquanto isso, na China, as empresas já vêm se adaptando devido à guerra comercial EUA-China instaurada no primeiro mandato de Trump, o que pode dar uma certa vantagem competitiva para que explorem outros mercados, como o europeu, para compensar eventuais perdas. Em resumo, uma política comercial mais agressiva dos EUA deve resultar em um isolacionismo econômico ainda maior, trazendo impactos em cadeia para o comércio global.
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