Donald Trump garantiu seu retorno à Casa Branca a partir do próximo ano — ele é o segundo presidente na história a conseguir um segundo mandato não consecutivo. Acompanhei atentamente a apuração dos votos, e à medida que os resultados da Geórgia e da Carolina do Norte foram divulgados, ficou evidente que o cenário estava se complicando para os democratas. Trump não só superou seus próprios resultados de 2020, como também superou as projeções de intenção de voto. Nas primeiras horas da madrugada, ele conquistou a Pensilvânia, consolidando sua vitória com grandes chances de assegurar os demais estados-pêndulo. Embora tenha previsto a vitória de Trump, a magnitude de seu sucesso me surpreendeu. Novamente, as pesquisas subestimaram a participação dos eleitores, resultando em algo distante da realidade.
Além disso, Trump parece estar a caminho de vencer também no voto popular pela primeira vez (em 2016, sua vitória sobre Hillary Clinton ocorreu apenas no Colégio Eleitoral), e seu êxito ajudou os republicanos a retomarem o controle do Senado e da Câmara dos Representantes, garantindo a ele uma base legislativa forte para os próximos dois anos. Esse cenário gerou uma natural volatilidade nos mercados, que reagiram prontamente. Internacionalmente, o dólar se fortaleceu em relação a outras moedas e deve seguir a mesma tendência frente ao real. O Bitcoin atingiu novas máximas, chegando a 76 mil dólares, impulsionado pelo apoio de Trump ao setor de criptomoedas. Nos títulos do Tesouro dos EUA, os rendimentos renovaram suas máximas, com os juros dos papéis de 10 anos projetando 4,45%, enquanto os mercados futuros em Nova York mostraram alta, antecipando políticas fiscais expansionistas, protecionismo e desregulamentação na nova administração.
Por outro lado, as commodities sofreram quedas acentuadas devido ao fortalecimento do dólar e à promessa de Trump de adotar uma postura mais rígida contra a China — uma combinação que representa um duplo impacto para os mercados emergentes, que aguardam novos estímulos econômicos na China até o final da semana. As eleições de 2024 forneceram valiosas lições sobre o impacto dos movimentos anti-incumbentes, um aprendizado que pode ser especialmente relevante para o cenário político do Brasil em 2026. Uma possível virada do pêndulo político no Brasil, em direção a um ambiente mais pró-mercado e positivo para ativos de risco, dependerá, em grande parte, da organização e estratégia da direita local. Se fizer direito, o jogo irá virar como nos EUA.
Antes de falarmos sobre as eleições americanas…
No Brasil, ontem foi mais um dia positivo para os ativos locais, impulsionado pela expectativa em torno dos resultados das eleições americanas e pelas discussões em Brasília sobre o aguardado pacote de cortes de gastos do governo. Em uma reunião ampliada com ministros, ficou reforçada a possibilidade de que esses cortes afetem várias áreas, incluindo setores estratégicos para o presidente Lula. Líderes do PT na Câmara dos Deputados sinalizaram que a redução de despesas será prioridade nas discussões da bancada até o final do ano, pressionando o Congresso a aprovar as medidas rapidamente. Apenas o anúncio do pacote já poderia trazer certo alívio.
Para conter a volatilidade nos mercados domésticos, especialmente com a confirmação da vitória de Trump, é crucial que o pacote fiscal seja substancial e ofereça garantias de controle sobre as contas públicas. O mercado aguarda cortes na faixa de R$ 30 bilhões a R$ 50 bilhões, o que, se implementado, poderá contribuir para estabilizar tanto o dólar quanto as taxas de juros, que têm estado sob pressão há algum tempo.
Além dessas medidas, outras pautas importantes continuam no radar dos investidores, como a Reforma Tributária e a próxima reunião de política monetária do Banco Central. A votação do texto de regulamentação da reforma tributária está prevista para o início de dezembro no Senado, embora o cronograma esteja apertado. Quanto ao Comitê de Política Monetária (Copom), é esperado para hoje um aumento de 50 pontos-base na taxa de juros, em resposta às pressões inflacionárias no atual cenário econômico.
Todo mundo esperava o resultado e ele chegou
Nos EUA, os índices de ações registraram alta ontem, enquanto milhões de americanos compareciam às urnas para escolher o próximo presidente, além de votarem para o Congresso e disputas estaduais e locais. Nas semanas anteriores, milhões de eleitores já haviam antecipado seus votos. Historicamente, o dia da eleição tem sido positivo para o mercado de ações, e a tendência se confirmou. O S&P 500 avançou 1%, o Dow Jones Industrial Average subiu 1,2%, e o Nasdaq Composite fechou com ganho de 1,4%. Até o “medidor de medo” de Wall Street, o Cboe Volatility Index (VIX), recuou, registrando uma queda de 7% e chegando a 20,5 pontos.
Mesmo antes da confirmação oficial, o mercado já apontava para uma possível vitória republicana em Washington, o que costuma ser favorável para as ações, considerando as expectativas de cortes de impostos e desregulamentação. Além do cenário eleitoral, os investidores aguardam hoje os resultados corporativos de empresas como Arm Holdings, CVS Health, Marathon Oil, MercadoLibre, Novo Nordisk, Qualcomm, Take-Two Interactive Software e Toyota Motor, que prometem movimentar o mercado.
Sim, foi um “landslide”
As eleições americanas caminham para um desfecho com forte probabilidade de vitória republicana na Presidência, no Senado e na Câmara. Embora eu já previsse a vitória de Trump na Casa Branca e uma maioria republicana no Senado, como mencionei anteriormente, não imaginava que o triunfo seria tão abrangente, incluindo também a Câmara. Neste momento, enquanto escrevo, Trump acumula 267 delegados e lidera em todos os estados ainda pendentes de resultado. Apenas o Alasca, tipicamente republicano, já seria suficiente para garantir sua vitória, embora ele possa vencer em todos os estados restantes, configurando uma vitória esmagadora. Isso se torna ainda mais expressivo ao considerar que ele deve ganhar também o voto popular, algo inesperado. No Senado, os republicanos já asseguraram 51 assentos, suficientes para a maioria (que requer 50), e lideram em pelo menos mais quatro estados. Na Câmara, os republicanos elegeram 197 deputados até agora, aproximando-se dos 218 necessários para a maioria. Além disso, nas disputas estaduais, a maioria dos governadores eleitos também são republicanos, com 27 estados sob seu comando.
Esse cenário, no entanto, tende a gerar certa volatilidade e nervosismo no mercado, especialmente com uma concentração tão grande de poder. Mesmo assim, é uma configuração favorável para as ações americanas e para o dólar. Provavelmente, veremos a extensão dos cortes de impostos introduzidos em 2017, incluindo uma redução adicional nas taxas corporativas e um leve alívio fiscal para trabalhadores. Sob as regras orçamentárias vigentes, uma extensão permanente desses cortes exigiria grandes reduções nos gastos públicos e na burocracia federal. Além disso, podemos esperar uma diminuição nos subsídios para energia verde, foco em reformas no Medicaid, e aumentos nas tarifas sobre produtos da China e da União Europeia, além de uma redução significativa nos fluxos líquidos de imigração para os EUA.
Uma mudança na postura do Fed?
As políticas econômicas propostas pelo presidente-eleito (mais uma vez) Donald Trump podem ampliar o déficit e tornar mais difícil a tarefa do Federal Reserve no controle da inflação. Isso sugere que o banco central pode precisar adotar uma postura monetária mais rígida para equilibrar o aumento de estímulos fiscais e lidar com potenciais choques de oferta ou demanda, em um momento em que a economia americana já apresenta um crescimento robusto e um nível de desemprego relativamente baixo. Estima-se que as políticas de Trump adicionem cerca de US$ 7,8 trilhões à dívida nacional ao longo da próxima década. Entre as propostas, destacam-se a extensão e expansão dos cortes de impostos do “Tax Cuts and Jobs Act” de 2017 e isenções fiscais para horas extras, gorjetas e renda de seguridade social.
Além disso, as promessas de Trump sobre imigração e tarifas comerciais podem adicionar volatilidade ao cenário econômico e redirecionar o foco do Fed para o combate à inflação. Se essas políticas forem implementadas, o Fed pode ver uma pressão renovada sobre os preços, justo quando a inflação começa a se aproximar da meta anual de 2%. Isso dificultaria os planos do banco central de reduzir as taxas de juros nos próximos anos. Embora o Fed não deva alterar suas taxas com base apenas em promessas de campanha, seus modelos econômicos certamente responderão às expectativas. Ainda podemos ver novos cortes de 25 pontos-base neste ciclo, como o desta semana, mas dependendo das políticas aprovadas no próximo ano, o ciclo de redução de juros pode não ser tão longo quanto o esperado, o que representa um cenário desafiador para mercados emergentes, como o Brasil.
Reagindo
O primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, já parabenizou Trump por sua vitória eleitoral. Tradicionalmente, independentemente de quem esteja na Casa Branca, o apoio dos Estados Unidos a Israel é visto como um compromisso histórico e praticamente incondicional, embora enfrente algumas reservas entre setores democratas. Com os republicanos no comando, espera-se uma postura americana mais incisiva no Oriente Médio. Isso deve intensificar a política dos EUA na região, especialmente em relação ao Irã, que vê o retorno de Trump com apreensão e deve se preparar para uma abordagem muito mais rigorosa por parte de Washington.
Nas próximas semanas, o preço do petróleo tende a oscilar com maior volatilidade, à medida que os países do Oriente Médio ajustam suas expectativas a esse novo cenário geopolítico. Internamente, Netanyahu também enfrenta desafios em sua coalizão após a demissão do ministro da Defesa, Yoav Gallant, que mantinha uma posição divergente em relação aos membros mais radicais do governo sobre os objetivos do conflito. Gallant apoiava a ideia de criar uma alternativa de governança para Gaza após o conflito e defendia um acordo diplomático temporário. Agora, quem assume o Ministério da Defesa é Israel Katz, atual ministro das Relações Exteriores e aliado de Netanyahu.
FONTE Empiricus Research