sexta, 29 de março de 2024
20/08/2010 | 00:00

Narcóticos Anônimos: uma luz na escuridão do vício

 

 

Quando falamos em vícios, alguns definem como caminho sem volta. Outros juntam forças de todos os lados para mostrar que a possibilidade de saída e resgate da autoestima de todo o problema existem. Os Narcóticos Anônimos são uma dessas saídas procuradas por muitos viciados pelo mundo. Além de servir como apoio e orientação, a irmandade (como assim se definem), busca resgatar pessoas com qualquer tipo de vício, como drogas, remédios, jogos ou álcool.

 

Em Itajaí, o grupo já existe há sete anos e as reuniões contam com uma média de 15 pessoas, a maioria deles na faixa etária entre 20 e 40 anos.  Todo o trabalho para auxiliar um dependente  químico é realizado em cima de princípios e literaturas, que foram adaptados do trabalho dos Alcóolicos Anônimos (A.A) e escrita por membros no decorrer dos anos. Uma das “bíblias” é o livro Só por Hoje, onde cada dia do ano tem uma palavra de meditação e sugere o tema a ser trabalhado na reunião, que são divididos através de livretos chamados I.Ps (Informações ao Público). Os temas tratados vão desde a auto-recuperação, recaídas e princípios dos N.A. “A partir disso, ocorre a partilha de experiências, onde cada um traz a sua dificuldade e história de vida,” afirma Rogério (que preferiu não identificar o sobrenome), um dos coordenadores do Subcomitê de Itajaí.

 

A ênfase na prática de princípios espirituais é um dos pontos principais do programa. “Não pregamos nenhum tipo de crença. Mas admitimos a intervenção de um poder maior, onde cada um o compreende à sua maneira,” explica Rogério.

 

Um termo bastante empregado no grupo é a “adicção”, que significa quando a pessoa se torna escrava de alguma coisa. O adicto é alguém controlado pelas drogas. E admitir ser um deles já é um grande  passo para buscar ajuda. “A pessoa precisa admitir o problema e querer realmente parar de usar,” afirma Rodrigo (que preferiu não identificar o sobrenome), coordenador de informações públicas do Subcomitê do Vale de Itajaí.

 

Não há limite para permanência no grupo. “Alguns procuram o grupo depois de um período de internação e estão há anos conosco. Não estabelecemos nenhum período para a participação das reuniões,” explica Rodrigo.

 

 

O N.A vive de contribuições advindas apenas dos integrantes do grupo. Todas as aquisições de materiais são tratadas e definidas entre os membros, mas não recebem contribuição de nenhuma entidade externa.

 

Uma vida de perdas e isolamento

 

* João,45 anos, sabe exatamente a dor e o sofrimento de um usuário. Hoje está com 45 anos, mas foi dependente por mais de trinta. A vida nas drogas começou ainda adolescente, com 13 anos. Amizades, falta de autoaceitação, adicionado a outros fatores emocionais fizeram de João um usuário de maconha. E como todo iniciante achou que poderia parar a hora que quisesse. “Sempre achamos que temos esse controle. E no final das contas, a maconha serve como porta de entrada para todo viciado,” explica.

 

A família desde cedo desconfiava, mas João preferiu sair de casa aos 14 anos e enfrentar o vício sozinho. No decorrer dos anos usou todo tipo de droga, desde cocaína, drogas injetáveis, até remédios. Ele retrata que o isolamento é a pior parte da vida de um dependente químico.  “Sofri com o afastamento da família, com a perda de amigos e assim, fui me isolando cada vez mais. Não tinha horário, mudei meus hábitos, não cuidava da aparência, a vida acaba ficando do avesso,” explica.

 

Apesar do uso, João ainda conseguiu estudar e fazer uma vida profissional, até pelo anseio de sustentar o vício. Mas conta que diversas vezes perdeu tudo tanto na parte profissional como na pessoal e teve que recomeçar do zero. Pela função que desenvolve (João preferiu não revelar), a internação sempre foi uma dificuldade. “Para o usuário lidar com a exposição é um problema. Ele mesmo cria uma barreira em torno de si, com um falso orgulho de que pode resolver tudo sozinho. Temos a ilusão que as pessoas desconhecem o que se passa conosco,” ressalta.

 

João conheceu o grupo dos Narcóticos Anônimos há dois anos, quando se viu no fundo do poço após o término de um casamento de 20 anos. “Essa foi a hora que eu me vi sem ninguém. E reconheci que estava na hora de buscar algum auxílio,” comenta João, que ainda freqüenta as reuniões do N.A e se sente feliz em participar do grupo. “Há um resgate da própria espiritualidade, compartilhamos histórias de vida e nos ajudamos mutuamente. No mundo dos dependentes você não tem amigos, você não tem uma religiosidade, não tem nada. Só o desejo de sustentar o vício.”

 

Com um filho de 23 anos, se fazer presente com orientações usando o próprio histórico como exemplo é uma das maneiras de evitar que o filho conheça esse pesadelo.  “Procuro mostrar o quanto sofri e as oportunidades que perdi com este caminho. Tento dar a base e os esclarecimentos que na época sei que me fizeram falta,” ressalta.

 

Para João, o grande segredo e a mensagem a ser passada para qualquer dependente químico que queira sair do vício é único: admitir o problema e querer sair dele.

 

 (*O nome foi trocado para preservar a identidade)


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