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Geral
30/07/2010 | 00:00

O que leva os jovens a se envolverem cada vez mais cedo na criminalidade

 

 

Mais de 150 processos foram registrados neste primeiro semestre nas Delegacias da Criança e Adolescente no município envolvendo jovens nos mais variados tipos de infração. Assalto, roubo, homicídio, ameaça, dentre outros. Itajaí tem o segundo maior índice de criminalidade entre jovens no Estado, perdendo apenas para a capital Florianópolis. A delinquência infantil tem tomado grande espaço na mídia com notícias sórdidas, como esfaqueamento na saída da escola, formação de gangues e apreensão de 167 pedras de crack em escola municipal. Em Itajaí foram realizados mais de 4 mil assaltos e muito deles, com envolvimento dos jovens. Fatos que preocupam toda comunidade.

 

Motivos para envolvimento

 

Existem diversas razões que contribuem para adolescentes entrarem em conflito com a lei: famílias desestruturadas, fragilidade dos laços amorosos, comércio ou consumo de drogas, necessidade de sair da invisibilidade, de proteger a família e a si próprio, baixa escolaridade que resulta em baixos salários por falta de qualificação profissional, incentivo e influencia dos infratores maiores de idade para os menores servirem como “laranja” ou “mula”, aquisição de bens de consumo e o distanciamento da espiritualidade.

 

ECA - Estatuto da Criança e do Adolescente

 

O ECA, estabelecido em 13 de julho de 1990 e baseado na Lei Federal N.8.069, considera ato infracional toda conduta descrita como crime ou contravenção penal, conforme previsto no art. 103. Deste modo, o jovem infrator deve ser responsabilizado por todas as práticas que descumprirem a Lei, mas deverá ter a chance de corrigir seu comportamento através das medidas sócio-educativas.

 

A Constituição Federal de 1988 também estabelece a visão da criança e do adolescente como sujeitos de direitos. O Art. 227, afirma o seguinte: É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à saúde, à alimentação, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

 

 

 

Família

 

Raciel Gonçalves Junior, estudioso de temas relacionados aos jovens há mais de 15 anos, Presidente da ONG, Passos da Integração e membro de outras causas que envolvem os jovens, acredita que todo o histórico da família é pautado pelas condições de vida, que influenciam na formação da personalidade das crianças e adolescentes. “O conceito de família mudou muito, hoje o que existem são arranjos familiares, um homem e uma mulher vão morar juntos debaixo de um teto, se dizem família e colocam os filhos lá e explicam que são irmãos”, afirma. Estudos comprovam que os adolescentes envolvidos em atos infracionais não têm escolaridade, e os pais destes adolescentes também estão envolvidos em atos infracionais e não estudaram e a mesma coisa acontece com os avós. O histórico se repete. “Os adolescentes simplesmente reproduzem um modo de vida que sempre esteve presente em torno deles. Crescem sem valores”, conclui.

 

A ausência destes valores, a mudança de hábitos na sociedade, impõe à estes jovens que o poder de compra é o caminho exclusivo para alcançar valorização como ser humano. O adolescente aprende que sua felicidade está diretamente ligada à aquisição de roupas de marca, celulares de última geração, drogas e uma infinidade de produtos de consumo e os laços amorosos se perdem. Para a psicóloga Coordenadora do Centro de Internação Provisório (CIP) de Itajaí, Ana Paula Remer, a desestrutura familiar abate a criança ou o adolescente. Com esta carência sócio-afetiva os jovens tentam compensar este vazio com grupos de amigos, na rua, que se tornam a nova família deles, onde acabam se envolvendo com as drogas e entram na criminalidade.

 

Uma situação que já ocorre há muito tempo e se agravou na atual sociedade são os pais se distanciarem cada vez mais dos filhos, por conta do trabalho. “Os pais acham que os educadores devem formar o caráter dos filhos, mas os educadores têm 50 alunos para ensinar. A responsabilidade é dos pais”, afirma o Secretário de Segurança  Municipal Carlos Ely. A família é apontada como detentora da maior parcela de culpa por não prestar a devida estrutura aos filhos quando criança e adolescente. “A gente culpa as famílias, mas quais famílias? As crianças com alguns meses de idade acordam cedo para ir pra creche e retornam pra casa no final do dia, nos finais de semana os pais não tem muito tempo para ficar com os filhos. A responsabilidade da construção de caráter é levado para as escolas, onde os professores são mal remunerados, mal qualificados e desmotivados”, observa Raciel.

 

Drogas ilícitas

 

A prática de delitos normalmente está relacionada ao sustento do vício, sendo estimado que 80% dos assassinatos de jovens, entre 10 e 17 anos, estejam relacionados à droga no Brasil. “Eu acredito que a droga é geradora de todos os problemas que envolvem os jovens. Hoje em Itajaí, nos perímetros das escolas, as drogas tomaram uma situação insustentável, estamos perdendo o controle. Estes fatos que contribuem para o surgimento de gangues na cidade”, afirma o Secretário de Segurança Pública de Itajaí, Carlos Ely. Mas por que os jovens procuram as drogas? O Secretário acredita que não é por falta de vagas nas escolas, falta de habitação ou alimentação. “Os jovens na maioria dos casos têm tudo isto, mas não tem acompanhamento do pai ou mãe, vão para os arredores das escolas fumar maconha, depois cocaína e crack e acabam cometendo alguns delitos para manter este vício”.

 

 

A pena para o tráfico de drogas foi elevada para no mínimo cinco anos, com isto o Juiz da Vara da Infância de Itajaí, Carlos Roberto da Silva afirma que os médios e pequenos traficantes começaram a usar os adolescentes e jovens para atendimento nas bocas ou para servirem de “mulas ou “laranjas”, distribuidores da droga ou do dinheiro do tráfico. “A criminalidade hoje em Itajaí tem uma ligação muito forte com o tráfico”. Um dos problemas mais sérios enfrentados hoje pelo Poder Judiciário é cumprir a internação do menor de idade, não só para proteger a sociedade, mas principalmente protegê-lo do crime. “Não há mais espaços para internação, todos os Centros de Internação da região estão superlotados”, afirma o Juiz Carlos Roberto.

 

 

 

O CIP – Centro de Internação Provisória

 

O CIP de Itajaí em razão de um convênio realizado entre a ONG administradora e o Estado oferece 30 vagas para jovens que ainda não tiveram sua medida sócio-educativa definida pelo Juiz. Podendo ficar apenas 45 dias e atende as cidades de Piçarras, Navegantes, Itajaí, Balneário Camboriú, Camboriú, Itapema, Porto Belo, Bombinhas, São João Batista e Brusque. Mas pela falta de espaço para internações, o CIP acaba abrigando jovens que já tiveram suas medidas sócio-educativas aplicadas e continuam lá, até três anos. “Eles não poderiam continuar no Centro Provisório. Deveriam estar em outros centros, os chamados, CER – Centro Educacional Regional, que são destinados aos adolescentes com penas já aplicadas”, salienta o Juiz Carlos Roberto.

 

 “Mas uma vez a administração atual está deixando o sistema de lado, falta planejamento. Por que já não previram isto há cinco anos?. Não superlotou os centros de um dia para o outro”, acrescenta. “Se um menor cometer um crime bárbaro, fica em casa, não tem lugar para apreender o adolescente e a culpa não é do Judiciário é do Estado que não planejou”, enfatiza.

 

A maioria dos meninos que estão no CIP têm idade de 16 e 17 anos, segundo a Coordenadora Ana Paula Remer, as principais infrações cometidas são roubos e tráfico de drogas. Todos os dias os jovens internados recebem aulas de ensino do sistema EJA – Educação de Jovens e Adultos com professores da Rede Municipal. Têm Educação física, oficinas de TV e artes. Espiritualidade. Mantém uma horta no pátio do complexo e futuramente receberão uma sala de informática e Graffite. Recebem acompanhamento de psicóloga e assistente social que elaboram relatórios de seis em seis meses que é entregue para o Poder Judiciário.

 

O que pode ser feito

 

“Guarda Municipal na rua, fardada, uniformizada, devidamente repressiva, seria um começo, que é reivindicação de todas as direções das escolas de Itajaí. O objetivo é inibir jovens infratores e a população se sentiria mais segura. Para implantar esta Guarda Municipal vai levar algum tempo, Itajaí está atrasada” - Carlos Ely, Secretário de Segurança Pública de Itajaí.

 

Faltam Programas para os egressos do CIP. Não temos recurso para implantação. A Rede Municipal deveria prestar apoio sócio-familiar aos moradores da cidade. As escolas devem falar mais sobre ética, direitos e deveres da sociedade, estes valores estão perdidos. A atual sociedade preza ganância, o dinheiro já não tem mais o valor monetário e sim o valor moral” – Ana Paula do Amaram Remer, Coordenadora do CIP de Itajaí.

 

“Falta planejamento de presídios e centros de Internação para atender os infratores e dar um pouco mais de dignidade no sistema prisional” -Carlos Roberto da Silva, Juiz da Vara da infância

 

“Falta dar estrutura para as famílias desde o início, senão qualquer programa dado destinado aos adolescentes e as famílias é muito frágil, eles estão com marcas que são difíceis de sofrerem grandes alterações. Foram traumatizados. A experiência de rua deles é muito melhor, é muito mais a cara deles e mais divertido. Faltam espaços de lazer, cidadania, escolas noturnas, não é oferecido algo que vai ao encontro deles. A gente muitas vezes faz as propostas erradas, porque somos adultos realizando projetos para adolescentes, sendo que eles que teriam que nos ajudar a realizar os programas. Uma proposta que deu certo é street dance, do grupo Millenium que contempla jovens carentes, está aí há muitos anos com sucesso construindo uma liderança infanto-juvenil e faz a diferença. Mas funciona apenas de segunda a sexta. Faltam bons projetos e Políticas Públicas para a prevenção, porque depois que entra é difícil sair” – Raciel Gonçalves Junior, Presidente da ONG Passos de Integração e estudioso do tema.

 

 “Se um jovem planeja um casamento, obter um bom emprego, ter filhos e fazer que as condições oportunizem tudo isto, obviamente este jovem vai ter uma vida muito feliz. Ele foi motivado pelo casamento, pelos filhos, pela felicidade da construção de uma família. Mas ele também pode fazer um planejamento de morte, quando o fundo motivador ser algo negativo. Estas pessoas que fazem um projeto de morte estão distanciadas de Deus Jesus Cristo. A falta de oportunidade para o encontro com Deus oportuniza um projeto de morte. Se as pessoas tivessem a leitura, interpretação e aplicação da boa palavra de Deus, que cura, liberta e salva, não precisariam construir programas para prevenção e atitudes do gênero”. – Sandro Poffo, Padre e Diretor do Parque Dom Bosco.


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